Naturalmente, somos tentados a persistir. No entanto, a verdadeira alta performance está, muitas vezes, em reconhecer o momento exato de pular fora — essa é a essência do rethinking (repensar), como defende Adam Grant em sua emblemática palestra.
O termo “rethinking” é a pedra angular deste artigo, pois somente a capacidade de rever nossas crenças e ações com coragem e sabedoria nos torna realmente eficazes em ambientes mutáveis.
1. Porém, manter o foco não basta: evite a panela que esquenta devagar
Logo no início, Grant apresenta uma metáfora poderosa: a fábula da rã que não percebe a água esquentar até ser tarde demais — um mito, como depois revela. No entanto, esse mito carrega uma verdade profunda: em nossos desafios pessoais e profissionais, habituamo-nos tanto a rotinas e crenças, que deixamos de enxergar os sinais de crise — relativização da verdade e da moral, doutrinação escolar, censura à liberdade de expressão, tentativa de controlar a linguagem, militância da Suprema Corte— até que seja tarde.
Em organizações e carreiras, esse “aquecimento gradual” pode gerar uma inércia perigosa. Altos executivos — mesmo os mais inteligentes — muitas vezes resistem a revisar decisões erradas, pouco importando evidências claras em contrário .
2. Ademais, a armadilha do “escalonamento de compromisso”
Adicionalmente, Grant exemplifica essa armadilha com sua própria história: uma subida a um vulcão no Panamá, seguindo mapa incorreto e sem coragem de reconhecer o erro. O resultado? Horas perdidas, quase sem água, comida ou luz — a perfeita personificação do “escalonamento de compromisso” .
Famílias, empreendedores e gestores ficam reféns dessa mentalidade — continuar insistindo apenas para justificar escolhas já feitas — mesmo quando a evidência aponta o caminho oposto: Blockbuster, Kodak e BlackBerry são exemplos clássicos.
Além da história do vulcão, é importante entender por que somos tão propensos a persistir mesmo diante de evidências contrárias. Esse comportamento não é só emocional, mas também cognitivo: envolve viés de confirmação e uma necessidade de manter nossa autoimagem coerente. Ao investirmos em uma escolha — de tempo, reputação ou recursos — nosso cérebro interpreta o abandono como uma falha pessoal.
Além disso, a relevância dessa armadilha transcende a esfera individual:
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No mundo corporativo, persistir em um projeto falido drena tempo e capital, e retarda pivôs estratégicos.
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Na saúde física ou emocional, manter hábitos prejudiciais “porque já investi nisso” pode acarretar repercussões graves.
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Na vida pessoal, relações tóxicas são mantidas pela mesma inflexão: justificar o investimento e evitar o desconforto da mudança.
Para altos desempenhos, é crucial identificar com honestidade o ponto de inflexão — ou seja, quando o retorno esperado já não compensa o que está sendo investido — e ter a coragem de recalibrar.
3. Ainda mais, não confunda “grit” com teimosia
Surpreendentemente, estudos mostram que pessoas persistentes (as famosas “gritty”) frequentemente chegam a extremos — continuam apostando alto em cassinos mesmo com prejuízos, mantêm jogadores ruins na NBA, ou arriscam demais em montanhas, mesmo quando já não compensa .
Contudo, uma alta performance autêntica não surge de obstinação cega, mas de saber quando persistir e quando abandonar — de alinhar determinação à realidade. Ser “à prova de teimosia” não é força, mas sabedoria intuitiva.
4. Mais ainda, identidades fixas limitam mais do que aceleram
Na construção de uma carreira de alto desempenho, a identidade profissional pode se tornar uma armadilha: Grant foi mergulhador de alto nível, mas, ao entrar na faculdade, sentiu-se congelado, fisicamente e emocionalmente. Permanecer nesse papel era seu maior medo — “Se não sou mais mergulhador, quem serei?” .
Ele explica o fenômeno da identity foreclosure, quando nos fechamos numa única versão de nós mesmos, ignorando outras possibilidades. Só quando se permitiu enxergar outros papéis — psicólogo, professor, mágico — é que ressignificou suas forças e consolidou uma trajetória mais ampla — e efetiva.
A experiência de Adam Grant como atleta que não se reconhecia mais como mergulhador ilustra que identidades rígidas aprisionam nosso potencial. O conceito de identity foreclosure mostra que, ao nos definirmos por um único papel, deixamos de explorar novas interfaces de crescimento.
Profundamente, isso afeta:
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A capacidade de inovação: identidades fixas limitam novos pensamentos e arriscam estagnar.
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A elasticidade emocional: nos tornamos defensivos diante de qualquer ameaça ao nosso “eu consagrador”.
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O risco de obsolescência profissional: o mundo muda; quem não se reconecta com novas habilidades perde relevância.
Por isso, a alta performance exige:
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Autoconhecimento dinâmico: revisitar quem somos e quem queremos ser.
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Exploração contínua: experimentar papéis, hobbies, projetos que nos revelem diferentes facetas.
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Narrativa expansiva: em vez de dizer “sou isso”, prefira “posso ser isso e aquilo”.
Essa flexibilidade forma identidades resilientes, capazes de se reajustar à velocidade das mudanças externas.
5. Ainda, rotinas inflexíveis obstruem a evolução
Mesmo após ascender como docente e performance-oriented, Grant diz ter se acomodado: entrava em sala com o mesmo roteiro. A crítica de um aluno — “você não vive o que prega” — foi o catalisador. Ele utilizou seus conhecimentos de regulação emocional: em vez de defensiva, trocou por curiosidade, e passou a ensinar de formas novas, como aulas projetadas pelos alunos, “paixão em 1 minuto” e dinâmica reversa .
Essa prática de revisão anual — usar a curiosidade para desmontar e reinventar — transformou-se em seu “check up” didático.
O que é “paixão em 1 minuto” e “dinâmica reversa”?
A palestra menciona duas dinâmicas práticas usadas por Grant em sala para reconectar alunos com seu aprendizado:
“Paixão em 1 minuto”
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Cada aluno tem um minuto para explicar ao grupo algo que realmente ama — seja dentro ou fora da disciplina.
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O objetivo é: reconectar com interesses pessoais, explorar vulnerabilidades e aproximar a turma de paixões genuínas, gerando interesse autêntico e clima emocional empático.
“Dinâmica reversa”
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Inverter quem ensina quem: os próprios alunos assumem o papel de professores, desenvolvendo uma aula, atividade ou explicação sobre o tema.
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Isso engaja, dá responsabilidade e devolve a agência para o aluno — favorecendo autonomia e motivação intrínseca.
Ambas são ferramentas de rethinking incarnado: questionam a estrutura tradicional da aula, promovem reengajamento emocional e criativo, e acionam a aprendizagem ativa.
6. Por fim, implemente “check‑ups” para crescer
Baseado em sua experiência, Grant propõe um conceito simples, mas poderoso: check‑ups regulares para nossas diversas dimensões — carreira, relacionamentos, identidade .
Esses momentos não são chamados de “mudança de vida” nem “grande virada”, mas refletem pequenas travagens intencionais, revisitando metas, hábitos, valores e rótulos. Esse ritual é, por excelência, uma marca da alta performance — pois quem busca evolução contínua reconhece a necessidade de entrar em cena para pensar de novo.
Como fazer check‑ups anuais para revisar e reinventar?
Criar um rito de avaliação estratégica pessoal pode ser simples, mas exige disciplina:
🔁 Etapa 1: Marcar na agenda
Reserve um bloco fixo — início do ano, fim de semestre ou seu aniversário.
🔁 Etapa 2: Refletir nas 4 dimensões
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Identidade: Quem sou hoje? Quem quero me tornar? Existem roles abandonados?
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Resultados: Quais foram as conquistas e frustrações? O que não valeu o esforço?
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Processos e rotinas: O que funcionou nas estratégias diárias? O que virou piloto automático?
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Contexto e feedback: O que o ambiente e as pessoas ao redor indicam? Há pontos cegos?
🔁 Etapa 3: Ações pequenas, mas concretas
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Testar: Como a “paixão em 1 minuto” ou dinâmica inversa trazem variabilidade para sua rotina — seja em reuniões, mentoria, projetos criativos.
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Cortar: Identifique ao menos uma ação ou projeto que não traz mais valor e descontinue.
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Reinventar: Pense em temas ou habilidades completamente novos que gostaria de explorar no próximo ciclo.
🔁 Etapa 4: Documentar e avaliar
Registre resultados — o que mudou, o que emergiu — e compartilhe com alguém de confiança, para refinar o olhar por meio da humilde escuta.
O objetivo não é reformular tudo, mas manter em movimento o motor do rethinking. Pequenas travadas, vacilações intencionais, e velocidade para saltos — isso sim é alta performance genuína.
🧠 Conexão Profunda com Alta Performance
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Persistência e sabedoria caminham juntas — quem ignora dados ou sensações arrisca falhar.
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Identidades flexíveis se adaptam ao cenário e são capazes de liderar suas próprias transformações.
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Dinâmicas de re-engajamento (paixão em 1 minuto, ensino reverso) quebram a rotina, ativam o cérebro criativo e engajam emocionalmente.
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Check‑ups regulares garantem que não estejamos presos ao conforto ou ao erro — mas ativos na construção contínua de excelência.
7. Além disso, cultive a “humildade confiante”
Um ambiente de alto desempenho transborda confiança e segurança, não arrogância. Grant sugere o que chama de “confident humility” (humildade confiante): admitir que não sabe, aceitar críticas duras, e convidar os outros a questionarem — como fez Melinda Gates ao ler críticas severamente contrárias durante um evento no Gates Foundation.
Líderes que se protegem do feedback geram equipes medrosas; já os que encorajam o contraditório, criam ambientes inovadores, acelerados e resilientes.
🔄 Conclusão
Conexão definitiva com alta performance
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Tomar distância de metas propostas, quando as evidências mudam.
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Transformar determinação em adaptabilidade — a coragem de recalibrar.
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Expandir sua identidade profissional, adotando múltiplos papéis estratégicos.
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Revisar rotinas antes que virem rotina mental.
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Implementar ciclos regulares de reflexão, não apenas empurrar resultados.
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Estabelecer uma cultura de humildade e abertura crítica.
Todas essas práticas não apenas cercam o indivíduo de excelência, mas formam ecossistemas de alta performance, onde aprendizado é permanente e fronteiras são revisáveis.
Em última análise, a metáfora da rã não é sobre ignorância — é sobre quem se acostuma ao status quo. A verdadeira elite de alta performance sabe reconhecer quando a chaleira está ficando quente demais e pular para uma nova perspectiva. Isso exige coragem — a coragem de duvidar, de questionar o próprio progresso.
Portanto, a mensagem final é clara: mais do que perseverar, precisamos saber parar. Mais do que acreditar em nós mesmos — precisamos saber duvidar, antes que o calor da “zona de conforto” se torne fatal. É isso que transforma gestores, atletas, empreendedores e líderes em verdadeiros mestres de alta performance.
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